Humanidade e energia
A humanidade ao longo de sua história evoluiu a forma como obteve energia da natureza e foi justamente essa evolução que marcou grandes avanços para sua história. A sobrevivência humana tornou-se mais fácil com o domínio do fogo, a agricultura com auxílio de tração animal e correnteza de rios tornou-a mais produtiva e as grandes navegações só foram possíveis graças a utilização da força dos ventos (e não mais a força muscular em navios a remo).
Grandes eventos históricos, como a Primeira Revolução Industrial e a corrida espacial durante a Guerra Fria, estão intimamente ligados ao avanço da matriz energética utilizada. Assim, é possível relacionar o avanço tecnológico de uma sociedade baseado na forma como ela extrai energia do ambiente que a cerca. Dentre elas está a energia Nuclear.
Energia sustentável e não sustentável
Das diversas formas de obtenção de energia conhecidas pela humanidade, há meios de menor impacto ambiental e cujas fontes são de fácil obtenção e renovação na natureza. Essas fontes de energia são chamadas de renováveis e a energia que elas produzem são sustentáveis.
Há também um outro conceito que por vezes pode ser confundido com sustentabilidade : energia limpa. A energia limpa é aquela que possui fontes não emissoras de gases contribuintes ao efeito estufa. Sendo assim, ser renovável não garante uma produção de energia limpa e vice versa.
A matriz energética mundial atualmente é muito dependente de fontes não renováveis, como o petróleo. De acordo com o Agência Internacional de Energia, o petróleo e seus derivado são responsáveis por 31,9% da produção energética. Em segundo lugar está o carvão com 27,1% seguido pelo gás natural com 22,1%. Essa situação é insustentável, pois além de se tratar de fontes altamente poluentes, contribuindo no efeito estufa e aquecimento global, são fontes não renováveis.
A energia dos átomos : fissão e fusão nuclear
Os átomos são compostos por elétrons, possuem carga negativa e estão na eletrosfera, prótons e nêutrons, estão no núcleo e possuem respectivamente carga positiva e neutra. A energia nuclear é aquela proveniente da alteração ou rompimento do núcleo do átomo.
Esse núcleo está tão fortemente unido que, ao sofrer qualquer alteração, é capaz de liberar uma incrível quantidade de energia. E existem duas formas conhecidas pelo homem de obter essa energia nuclear : rompendo o núcleo dos átomos ou unindo o núcleo de dois átomos.
Imagem ilustrativa de um átomo
Para o processo de fissão nuclear, quando os átomos são rompidos, é utilizado o elemento Urânio. Esse elemento possui diferentes formas atômicas chamadas isótopos, ou seja possuem o mesmo número de prótons mas um número diferente de nêutrons. O que é feito de uma usina nuclear é basicamente adicionar um nêutron ao Urânio-235, assim o elemento resultante é o Urânio-236. Esse elemento é extremamente instável e como resultado dessa instabilidade ocorre a separação de seu núcleo liberando 2 outros elementos, nêutrons e uma incrível quantidade de energia. Os nêutrons liberados da primeira reação geram um efeito em cascata assim iniciam outras reações liberando mais energia a cada etapa.
Tal processo demandou da humanidade um incrível avanço científico para compreender toda a teoria atômica por trás e executá-la a seu favor. O urânio é o elemento usado no processo, pois outros componentes não realizariam o efeito cascata desejado e a obtenção da energia nuclear não seria viável. Ainda assim, trata-se de um elemento raro na natureza e é preciso separar os isótopos que não atendem aos requisitos. A separação de isótopos é denominada enriquecimento de urânio, a concentração de Urânio-235 irá determinar se o efeito cascata será possível e ainda qual a magnitude da energia liberada.
As bombas atômicas utilizam esse mesmo conceito para causar toda a destruição pelas quais são famosas, no entanto a concentração de Urânio enriquecido necessária para gerar energia nuclear em uma usina é menor que a concentração presente em uma bomba.
Nas usinas, essa energia é utilizada para aquecer a água que irá girar as turbinas e, dessa forma, gerar energia elétrica que irá abastecer as cidades.
Imagem de uma usina nuclear
A fusão nuclear, por sua vez, é realizada com a união de dois átomos. Quando isso ocorre, é liberado ainda mais energia nuclear quando comparado com a fissão. No entanto, para realizar esse processo é necessária uma quantidade de energia muito elevada, seria necessário elevar a temperatura do elemento a cerca de 10 milhões de graus Celsius. Esse é o processo que ocorre no interior das estrelas, toda a pressão exercida por sua massa também contribui para a fusão nuclear dos elementos e assim é possível realizar o processo a uma temperatura menor.
O motivo de ser um processo difícil de ser inicializado é a força de repulsão entre dois átomos. Os efeitos macroscópicos presentes em imãs estão presentes em toda natureza, trata-se da força de Coulomb. Ela dita que dois corpos carregados irão gerar uma força de repulsão ou atração diretamente proporcional à suas cargas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre os corpos. Em termos simplificados, quanto mais carregados os corpos, maior será a força de Coulomb e ainda ela é aumentada rapidamente quando os corpos são aproximados. “Os opostos se atraem”, essa frase é bem difundida e levada até mesmo para o âmbito social, ela veio justamente dos estudos desse cientista francês Charles Augustin de Coulomb.
É justamente a ‘barreira’ criada pela força de Coulomb que deve ser vencida para que o processo de fusão ocorra. Quando 2 átomos são forçados um contra o outro, suas eletrosferas (de carga negativa) sofrem uma força de repulsão que aumenta à medida com que elas se aproximam. A solução existente na natureza e presente nas estrelas é utilizar uma quantidade de massa absurda para forçar um átomo sobre o outro e ainda elevar sua velocidade, ou seja, elevar a pressão e temperatura. Assim, a fusão ocorre apenas no interior desses corpos celestes, onde as condições atendem aos requisitos extremos exigidos. Já aqui no planeta terra, não contamos com tanta pressão assim para realizar a fusão. Sendo assim, a solução do problema é aumentar ainda mais a temperatura do elemento.
O processo de fusão é mais eficiente e gera menos lixo radioativo, porém os requisitos para que ele ocorra são tão extremos que não existem atualmente nenhuma usina de fusão nuclear para abastecimento energético civil, apenas para pesquisa e estudos principalmente para a área da física.
Se a energia nuclear é tão eficiente, por que toda energia produzida no mundo não é proveniente de usinas nucleares?
Como mencionado antes, com o atual conhecimento da humanidade, não foi possível construir uma usina de fusão nuclear. É essa a energia do futuro e com maiores promessas, afinal é ela que sustenta a existência das estrelas por bilhões de anos. Quando analisamos todo o processo de obtenção por fissão, é possível notar alguns problemas que dificultam sua expansão na matriz energética mundial.
O caráter logístico da construção de uma usina é um dos fatores que a tornam uma das mais encarecidas quanto ao investimento inicial. Além de ser capaz de realizar o processo de ruptura do átomo, uma usina nuclear deve contar com diversos protocolos de segurança para garantir que acidentes não irão ocorrer com todo aquele material radioativo.
O acidente que ocorreu na usina de Chernobyl deixa claro que a radiação é um problema difícil de contornar e pode deixar sequelas em uma região muito vasta. Lembrando que um ser humano contaminado por radiação, diferentemente do mundo dos quadrinhos, não é capaz de sobreviver por muito tempo. O solo contaminado por radiação torna-se inviável para a habitação humana e uma zona de quarentena deve ser estabelecida para evitar maiores desastres.
Outro ponto que dificulta a utilização ampla de usinas é o lixo radioativo produzido. A radiação gerada não é eterna, há uma certa quantidade de tempo para cada elemento radioativo que, quando ultrapassado, deixa de ser uma ameaça para a vida. No entanto, durante todo o tempo de ameaça, o lixo radioativo deve ser bem guardado para que não ocorra contaminação. E enquanto esse armazenamento ocorrer, ocorre também gastos. Para uma usina nuclear, gasta-se antes e gasta-se depois para obter essa energia.
Antes mesmo da construção desta usina, já é necessário investir na obtenção do urânio e então enriquecê-lo para tornar viável sua utilização. De todo urânio do planeta, somente cerca de 0,7204% é do isótopo U-235. É esse o isótopo capaz de realizar todo o processo de fissão e gerar uma reação em cadeia para alimentar a usina.
Então, a energia nuclear é ou não a energia do futuro?
Como vimos anteriormente, há muitos gastos e contrapontos da utilização dessas usinas. Caso o mundo todo resolva de um dia para o outro magicamente utilizar apenas usinas nucleares, a humanidade estaria diante de uma quantidade de lixo tóxico absurda e as fontes de Urânio para abastecer tanta demanda seriam esgotadas em pouco tempo. No entanto, esse problema tanto de fonte quanto de tratamento do lixo são praticamente solucionados quando analisamos a fusão nuclear.
Em outras palavras, caso o mesmo cenário fosse imaginado mas agora com usinas de fusão nuclear, e não mais de fissão, a quantidade de energia produzida atenderia a todas as necessidades da população mundial muito antes de existir uma grande quantidade de lixo tóxico para ser lidado. Mas foi visto as dificuldades de realizar uma fusão entre átomos e utilizar essa energia de fato. Atualmente para realizar esse processo é gasto mais energia para iniciá-lo que a energia nuclear aproveitada resultante. Sendo assim, apenas com o avanço tecnológico seria possível executar esse processo de forma econômica para que ao final o saldo de energia seja positivo.
A humanidade em 1901, 121 anos atrás, observava pela primeira vez um objeto mais pesado que o ar voar com a invenção do avião. Em 1961 pela primeira vez um homem conseguiu viajar pelo espaço, 60 anos depois. Com a evolução da ciência os horizontes são ampliados e feitos que parecem absurdos são alcançados. É certo que manter a atual matriz energética é insustentável, sendo assim é necessário ampliar mais um horizonte e com toda certeza a energia nuclear deve ser encarada como um desafio de grandes recompensas. Já conseguimos sair do chão, chegamos ao espaço e até pisamos em solos além do planeta, hoje almejamos controlar a mesma fonte de energia que alimenta o universo. A energia nuclear com certeza é uma grande passo para a humanidade e pode nos levar a horizontes que não conseguimos sequer imaginar.
